Eu reuni um tanto de coragem e entreguei meus papagaios no Ibama!
A você leitor, antes de prosseguir a leitura, gostaria de te pedir que se desarme, descarregue suas ideias prontas sobre o tema, leia, reflita e só depois tente chegar a uma opinião.
Bem, meu nome é Dandara, eu comprei dois papagaios na BR 020 próximo a Barreiras/BA em 24/12/16. Eles estavam bem mal, um sol muito forte, dentro de caixas de sapato, e eu não consegui deixá-los para trás, acho que muita gente acaba caindo no erro e contribuindo com o tráfico por dó, mas hoje sei que isso só agrava o problema do tráfico no país, e que no fundo, não estamos comprando só um papagaio, estamos trazendo um problema para casa, além de estar colocando eles em risco, hoje sei que o melhor a fazer nesses casos é a denúncia. Ao comprar no tráfico, sem querer, você está dizendo que concorda com este comércio, com a forma cruel que ele é feito, e que é aceitável ver vidas apertadas em minúsculas caixas sob sol forte, você também está dizendo que pode voltar amanhã com novos filhotes, que vale a pena pois tem cliente.
Mas, vamos voltar a minha história…
A partir dali o plano era tentar legalizar os dois, assim em Barreiras/BA passei no Ibama e tentei pegar todas as informações possíveis, fui em vários criadouros, sempre a mesma resposta: “Não tem como legalizar ave ilegal! ”. Viajamos por 10 dias entre (Barreiras, Ibotirama, Bom Jesus da Lapa, São Félix, Correntina/BA), em todas essas cidades tentei algo, mas sem sucesso. Chegando em Brasília consultei advogados, Ibama, Ministério Público e por último falei com um amigo da família que por sorte trabalha no Ibama, ele me esclareceu tudo: “Até pessoas que tem papagaios a 40 anos ou mais, o órgão está caçando as autorizações antigas (importante lembrar que as aves que tem autorização de tutela dada pelo Ibama, as aves continuam sendo do Estado, ou seja, é legal a revogação do documento e perda da posse pelo tutor), e quem não tem esse documento paga multa de R$ 5.000,00 por ave.
Essa busca por um meio de legaliza-los durou uns 5 meses, durante este período eles já estavam falando; “Eu te amo”, “Cadê o Bebê da mamãe” e muitas outras palavras, sem contar que ficavam em silêncio até eu acordar para servir o café, tomavam banho comigo quase todas as tardes. Cada um tinha sua árvore e não ficavam em gaiolas, minha casa também era deles.
Em 23/05/17 eu reuni um tanto de coragem e devolvi, esse momento foi horrível porque eles pareciam entender. Maia fez um escândalo e queria voltar comigo, isso eu nunca vou superar.
Eu, ainda acredito no Ibama /DF, acompanho e vejo com frequência blitz e as multas são aplicadas rigorosamente, mesmo com tanta história triste, sou fã do Ibama, tenho grande admiração pelo trabalho deles. Acho que o melhor lugar para um animal é na floresta, por mais amor que possamos oferecer.
“Algumas tardes, eu via eles imitando os pássaros da rua, aquilo me cortava o coração, quando pensava que eles só tinham na minha casa uma árvore morta e os humanos.”
Muitos me criticaram por entregar, mas gostaria de dizer que não foi fácil, muitas vezes nos deparamos com situações que a ética, fazer o certo, briga com o coração. Precisei fazer terapia, para entender que entregar seria o melhor para eles e para toda a minha família, já que ao ficar estaríamos cometendo um crime. Aqui as leis nesse caso são rígidas, meu marido é militar, eu sou servidora Pública Federal, isso iria repercutir na empresa e eu iria ficar sem eles da mesma forma. Tem momentos que precisamos ser racionais, meu coração está apertado, mas minha consciência tranquila.
Como ficar com dois papagaios ilegais dentro de um apartamento? Em algum momento alguém poderia denunciar, seria então uma série de problemas, multa, processo, escândalo e eles mais velhos sem chance de reabilitação, estariam condenados.
Difícil é não relacionar a história dessa família com a situação atual de nosso país, quando ética, corrupção, moral são tão discutidas. O que posso dizer para vocês é que é preciso fazer o certo, é desse tipo de gente que precisamos para ser uma sociedade melhor, mais justa.
Sabemos que nem sempre fazer o certo é o caminho mais fácil, menos dolorido, mas temos certeza, que a longo prazo, trilhar o caminho dentro da lei, agindo com correção, ética e respeito, o fruto é bom, doce e melhor para todos.
A difícil escolha de Dandara, pode ter provocado uma imensa dor nela, no marido e nos dois papagaios, se ela não a tivesse tomado, pode ser que daqui a um tempo, ela estivesse chorando, pois teria dois papagaios apreendidos já mais velhos e muito ambientados a casa, acostumados aos hábitos humanos e sem poder voltar para a floresta, terminariam como atração em um zoológico ou quem sabe, como matriz em algum criadouro, e isso é como ser condenado ao limbo, você não tem a liberdade da floresta nem o carinho do seu bando, também não tem o afago de um colo humano, as brincadeiras, os brinquedos. O caminho escolhido por Dandara, o caminho da ética, de cumprir as leis, de ser reto, pode ser mais dolorido na hora, mas além de poder dormir tranquila, sem medo, sem sobressalto, sem precisar esconder ou rezar para nenhum vizinho denunciar, essa escolha fez com que eles hoje, estejam sendo preparados para voltar para onde não deveriam ter saído, vão cruzar todos os dias um céu azul, pousar nas mais altas copas de árvores, cantar, não música humana, mas a linda canção dos papagaios.